sábado, 20 de dezembro de 2008

Impressões



Letícia Kapper

Enquanto nós procuramos fugir do que nos apriosona e aderimos a viagens momentaneas proporcionadas pelo consumismo, eles, lá dentro do Presídio de Mafra, pensam em se livrar do sistema que lhes consome, literalmente.
O olhar de um rapaz, com não mais do que 20 anos, preso por estrupro e, por isso, em celas separadas dos demais, provocou em mim uma mescla de medo, pesar e raiva. Isso mesmo: raiva. Tal situação me levou a questionar a infância desse homem-menino. Segundo especialistas, as pessoas reproduzem comportamentos, sejam eles bons ou más. Assim, é comprovado, a agressidade é própria das vítimas dela. Daí a pergunta: a quem culpar?

Ele me observou de um quadrado da porta de ferro que o separa do mundo por longos minutos. Acreditem, o tempo num ambiente de reclusão não é nosso tempo. È um tempo doloroso, prolongado. O cheiro peculiar e repugnante da prisão, somado a uma sensação de incapacidade, despera.



No isolamento, outro rapaz com a vida inteira pela frente, dizia sentir muitas dores no corpo e implorava um analgésico. O pedido foi atendido, mas um atendimento médico não foi ao menos cogitado, simplesmente porque num presídio regional com mais de 300 detentos não há nenhum médico, nenhum psicólogo. Lamentável.

Ao lado do presídio masculino, a ala femina tem histórias macabras que se escondem por trás de rostos jovens e olhares atentos ao trabalho da equipe. Uma das que assiste a movimentação da gravação se propõe a ser personagem de um próximo documentário. Visivelmente busca chamar atenção e demonstra sua carência extrema, quem sabe um dos motivos que a tenha impulsionado a matar três pessoas numa tentativa de assalto.

Uma terceira mulher, com rosto de menina, busca ajuda para falar com o marido, preso em São Pedro de Alcântara. Com um bebê de seis meses nos braços, da qual deve se separar daqui a dois meses por determinação judicial, precisa localizar um parente. Sua filha pode acabar num orfanato.

Essas outras miseráveis vivências estão todas reunidas lá, num local construído para abrigar 70 pessoas mas dividida por 330. No meio desse turbilhão, os agentes penitenciários, que demonstram tentar manter a ordem e incentivar, de alguma forma, a fraternidade.

2 comentários:

Francisco Nunes disse...

Oi Le.
Na minha visão de leigo, pouco posso comentar sobre teu projeto, alem de acha-lo extremamente atual e de muita importância social, e que abordará um tema de grande interesse para toda a comunidade e que quase sempre não recebe a prioridade necessária por parte das autoridades constituidas.
Segue em frente, estamos torcendo por ti.
Abraços

Fernanda disse...

Olá Letícia!!!
Conversamos quando vc veio a Mafra, queria parabenisar-lhe pelo trailler, achei forte impactante, como precisava ser... Queria lhe dar a idéia de vir apresentar o documentário no presídio, para que os presos possam ver que as filmagens não foram apenas uma brincadeira e que tem gente que se preocupa com eles... Fale diretamente com o DEAP aí em Floripa, pq aqui já sabe né!!!
E se precisar de uma mãozinha aqui em Mafra me procura no Presídio...

Um Abraço e parabens pelo sucesso!!!

Posso só te pedir mais uma coisinha... se for possível porque vc não organiza para que o Bnegão viesse e desse uma palhinha, tenho certeza que seria inesquecível na história do nosso presídio...
Os presos iriam se sentir valorizados...